“A Reforma do Ensino Médio e o segundo ato da farsa”. Por Saulo Carvalho
por Saulo Carvalho
Como exemplo do que aconteceu no golpe trágico de 1964, a farsa de 2016 executa sua reforma educacional, tendo o Ensino Médio como alvo. E pasmem! A Lei 5692/71 que propunha reformar a LDB de 1961, também tinha como foco a eliminação de disciplinas do núcleo das humanidades. Sociologia, História e Geografia foram substituídas por peças doutrinárias que exaltavam um patriotismo cego e educavam para uma submissão impenitente. Hoje sob o pretexto de uma maior “liberdade” de escolha para o aluno, a Medida Provisória que pretende reformar o ensino médio, elimina o parágrafo IV do artigo 36 da LDB que estabelece que “serão incluídas a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias em todas as séries do Ensino Médio” (BRASIL, 2010, p.29), tornando-as facultativas.
Não estamos contando aqui as disciplinas de Artes e Educação Física, das quais o MEC diz ter sido um apenas um “engano” a sua retirada do currículo. Isso, um dia após a divulgação do texto da MP em meio a protestos da população que depende da escola pública. Mas, as coincidências não param por aqui. Como em 64, a parceria com setores privados, implantaria uma educação tecnicista e modular, necessária naquele momento para a formação de uma força de trabalho eficiente, obediente e de baixo custo. Hoje, as promessas de flexibilidade e inovação não diferem do propósito do passado. O aumento da carga horária obrigatória segue ao lado da redução de conteúdos a ser ministrados. O preenchimento das 600 horas a mais com menos disciplinas obrigatórias, não especifica o lugar e a forma como serão cumpridas tais horas. Isso abre um precedente enorme para que o setor privado, travestido de terceiro setor, possa vender seus serviços ao governo e abocanhar o erário. Tal medida se complementa com a desobrigatoriedade do diploma de licenciatura na contratação de docentes para o trabalho com o Ensino Médio. A possibilidade de contratação de “profissionais com notório saber” para lecionar, demonstra o verdadeiro significado do termo flexibilização incutido na Reforma. Isto é, a adequação do serviço público ao modelo privado de precarização do trabalho docente.
A desobrigação da licenciatura para o empregado leva automaticamente ao descompromisso do empregador em cumprir com os preceitos legais das profissões regulamentadas. No caso da docência, isso inclui piso salarial, pagamento de hora-atividade, acesso à formação, plano de carreira docente, entre outros direitos, que na atualidade têm deixado de ser cumpridas por muitos empregadores, Estados e Municípios.
Assim como no golpe trágico a reforma da educação foi feita a “toque de caixa”, a farsa dos dias de hoje tenta nos convencer de que haverá investimentos para cumprir as promessas de ensino integral do aluno, vinculando o financiamento a uma “[…] transferência de recursos [que] será realizada anualmente, a partir de valor único por aluno, respeitada a disponibilidade orçamentária para atendimento, a ser definida por ato do Ministro de Estado da Educação”. Ou seja, não somente retira as garantias de investimento da educação, como fere a autonomia financeira dos Estados concentrando o poder de decisão orçamentária nas mãos do Ministro da Educação. Em outras palavras, a MP “amarra” os Governadores ao “cabresto” do financiamento da educação. Sem contar que o farsante Michel Temer diz nos meios de comunicação que haverá 1,5 bilhão disponível para repasses aos Estados até 2018. Isso é muito pouco se compararmos com as complementações do governo federal ao FUNDEB, que em 2009 giravam em torno de 5,1 bilhões e a partir de 2010 passou a corresponder a 10% da contribuição total de todos os estados e municípios do país. Juntando isso à PEC 241 que prevê o congelamento de gastos dos serviços públicos por 20 anos, o golpe farsesco de 2016 pretende reduzir nossa educação a pó em poucos anos.
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Sobre o autor: Saulo Carvalho é professor do curso de Pedagogia na UNICENTRO, campus Guarapuava-PR e Doutor em Educação Escolar pela UNESP-Araraquara; escreve às terças-feiras no Jornal Caboclo.
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