A agroecologia e o futuro da agricultura
por Padre Pedro Baldissera
Inicio nesta semana, escrevendo num espaço fundamental para a comunicação das comunidades do Meio Oeste, que é o Jornal Caboclo. Agradeço pela oportunidade e espero criar um canal de diálogo direto com Fraiburgo e toda região.
Aproveitando a realização, nesta sexta-feira (25), das edições do Seminário Agroecologia, Biomas e Educação do Campo em Fraiburgo e Legon Régis, abordo um pouco destes temas transversais que considero fundamentais ao futuro da produção de alimentos, e de todas as populações, mas em especial aos jovens filhos e filhas das famílias da agricultura.
Estes temas são fundamentais, em especial a agroecologia, porque dizem respeito à viabilidade da agricultura e à manutenção das famílias no campo, com qualidade e vida. A agroecologia, enquanto sistema de produção, significa geração de renda e a reprodução de um sistema que valoriza não só as vidas daqueles e daquelas que produzem o alimento, mas também das pessoas que os consomem e de toda sociedade, pelo que significa em termos ambientais.
Nos diversos debates que realizamos com pesquisadores e especialistas, de universidades brasileiras e do exterior, observamos que há uma visão unânime de que, pelas condições de ocupação da terra em Santa Catarina, o sistema que apresenta maior viabilidade, qualidade e ganho para a agricultura familiar e camponesa, é a agroecologia. Isso porque mais de 80% das unidades é pequena, e em geral tem em sua composição o trabalho da família. Neste contexto, a agroecologia representa uma perspectiva de valorização do meio rural para os jovens; aumenta a renda e é um caminho desatrelado dos pacotes tecnológicos que envenenam não só as famílias da agricultura, mas o solo, a água e o ar.
Aqui ingressamos no tema dos biomas e da importância da preservação das condições naturais; importância inclusive para a economia. Porque o que é comum, e sobre isso quero refletir, é que a pauta do ganho financeiro ultrapassa, sempre, a pauta da vida. O debate, que deve ser humano e social, envereda quase sempre para o tal inevitável “preço do desenvolvimento”. Ou seja, muitos daqueles que, por exemplo, indignam-se com a escassez de água nos períodos de pouca chuva e muito calor, são os mesmos que, ao longo do ano, defenderão que seja exaurida a capacidade de um córrego para garantir abastecimento a uma grande plantação. Ou então, que considerarão uma “perda menor” caso a poluição em um rio for necessária para gerar alguns milhões em lucros para determinado grupo ou conglomerado empresarial. Isso significa, neste pensamento, um “mal necessário” para gerar empregos e riquezas (mesmo que muitas vezes seja a riqueza de um e a míngua de muitos).
Mas ele será necessário mesmo? E qual o preço que pagamos por isso? Somos capazes de investir, no mundo, 5 mil vezes mais em prospecção de petróleo do que na preservação de mananciais hídricos; somos capazes de envenenar a terra e a água que nos garantem alimento e vida. Sempre digo que nunca vi ninguém acordar pela manhã e tomar um copo de gasolina, comendo um maço de notas de R$ 100. É claro que precisamos deste combustível, como precisamos de papel, de roupas, de milhares de produtos, de recursos financeiros, de empregos. Mas será que não estamos, todos e todas, perdendo dia a dia nossa capacidade de ver o essencial, de nos voltarmos para questões primordiais. Não estaríamos atrelando um consumo desmedido a uma desmedida relação parasitária com a natureza e, principalmente, com a água? Qual o preço deste conceito tão confuso de “desenvolvimento”? E qual é o objetivo?
Por estas razões, sociais e ambientais, queremos debater a necessidade de ampliação da pesquisa e do investimento em extensão voltado à agroecologia. É preciso apoiar nossos agricultores e agricultoras nesta transição. Hoje é inexpressiva a atenção dada pelos órgãos públicos ao setor, em geral dependendo da garra e da força de servidores que buscam isoladamente avançar. E mesmo com esta clara omissão, a agroecologia é o setor da produção agrícola que mais cresce em nosso Estado.
A produção sustentável, sem agrotóxicos, é a forma da agricultura familiar responder à necessidade urgente de garantir a preservação; não somente a preservação dos biomas, mas da própria espécie humana.
O debate acerca da “ecologia integral” ganhou especial destaque, recentemente, em razão da atenção destinada pela comunidade científica a documentos como a Encíclica Laudato si, publicada pelo Papa Francisco em 2015, e o texto base da Campanha da Fraternidade 2017, que trata exclusivamente dos biomas brasileiros. Isso reforça a necessidade de debate, em fóruns e espaços populares, do binômio produção/preservação.
A Educação do Campo, por fim, nos remete a um centro produtor e difusor de conhecimento, que deve estar atento a estes debates. É fundamental à sociedade construir políticas públicas que garantam pesquisa e desenvolvimento à produção sustentável. Além disso, é preciso fomentar uma educação de base libertadora, que proponha o diálogo, a problematização e o avanço de práticas sustentáveis desde a formação inicial garantida às famílias da agricultura. Por isso a educação do campo é também uma base fundamental de todos estes debates.
Espero que estas reflexões sirvam para instigar o debate, pela nossa sociedade, sobre o futuro da produção de alimentos, das famílias do campo e da cidade, e de todo nosso planeta.
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Sobre o autor: Padre Pedro Baldissera é deputado estadual, presidente do Fórum Parlamentar pela Preservação do Aquífero Guarani e das águas superficiais; escreve no Jornal Caboclo como colaborador.
(Foto de capa: registro do dia 25 de agosto de 2017 de auditório da escola do Assentamento 25 de Maio, em Fraiburgo.)
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