Obscurantismo da BNCC: o mais do mesmo. Por Saulo Rodrigues Carvalho
por Saulo Rodrigues Carvalho
A última versão da Base Nacional Curricular Comum (BNCC) foi anunciada. Foram realizadas quatro rodadas de discussões, as duas primeiras versões tiveram ampla participação da sociedade civil, principalmente das associações ligadas ao campo educacional e produção científica em educação: ANPed (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação), Anfope (Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação), Cedes (Centro de Estudos Educação e Sociedade), Forundir (Fórum Nacional de Diretores de Faculdades, Centros de Educação e Equivalentes). Contudo, as 3ª e 4ª versões tiveram a interferência direta do MEC e do CNE. Ainda na 3ª versão, o MEC retira as discussões sobre racismo, homofobia, gênero e sexualidade, agindo como censor do governo. Acatando ao lobby do empresariado e do campo religioso, assimila um currículo tecnocrático e estabelece a obrigatoriedade do ensino de religião para todos os anos do ensino fundamental. Paira a dúvida ainda no MEC se o ensino religioso deveria ser mais uma área do conhecimento, ou ser incorporado como um saber da área de Ciências Humanas. O Conselho Nacional de Educação (CNE), frente a tudo isso se calou e referendou um documento, incompleto e incoerente. Apenas 3 conselheiros votaram contrários à quarta versão organizada pelo governo. Prevaleceu o obscurantismo. A última versão, que poderá ser alterada, pois há indefinições, vem a público sem ter sido discutida com a sociedade civil, sem levar em conta as proposições das organizações de classe e dos fóruns acadêmicos. Trás consigo o velho e despótico ecletismo esclarecido, a união do liberalismo econômico com o pensamento tradicional religioso. O espírito moribundo de Silvestre Pinheiro Ferreira, o primeiro a conciliar Aristóteles e John Locke, desceu sobre os ombros reacionários do MEC e CNE para levar a nossa Base Curricular aos tempos do primeiro império. A BNCC nasce assim, já velha, cheia de vícios, antidemocrática e obscurantista. Como diria Florestan Fernandes ela é o retrato de nossa burguesia autocrática: modernizadora em termos tecnológicos e produtivos, mas conservadora, reacionária e ultrarreacionária nos fins políticos e ideológicos. Temos assim, uma BNCC, que intenta uma formação única e exclusivamente para atender um mercado de trabalho instável e precarizante, pronta para formar trabalhadores que sejam tecnicamente úteis e subservientes ao empresariado. E, se acaso ainda permanecerem na pobreza, porque para a ideologia do mercado a culpa da pobreza é sempre do pobre; já saberão rezar.
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Sobre o autor: Saulo Carvalho é professor do curso de Pedagogia na UNICENTRO, campus Guarapuava-PR e Doutor em Educação Escolar pela UNESP-Araraquara; escreve semanalmente no Jornal Caboclo.
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