Jornal Caboclo

da região do Contestado, SC

Colunas e Opinião

Meu pai me ensinou, escreve Edison Porto

Passei para meus filhos o que aprendi com seu avô Zé Porto

Por Edison Porto

Filho, quando você desembrulhar uma bala, um chocolate, se não houver um cesto de lixo por perto, guarde o papel no bolso, quando você encontrar uma lixeira, jogue lá!”  – Este foi um ensinamento que recebi na mais tenra idade e nunca esqueci. Eu teria quantos anos?  Quatro ou cinco anos, não muito mais do que isso, mas nunca esqueci!

Eugênio José Porto (Meu pai)

Meu pai me ensinou muito com os seus modos, sua maneira de se portar, de falar com as pessoas, de pedir informações, de dar orientações a quem precisava. Andar ao seu lado, estar com ele, era um aprendizado o tempo todo, e assim ele me ensinou não só com instruções verbais, mas simplesmente sendo ele mesmo.

Zé Porto, como era chamado o meu pai Eugênio José Porto, era um sujeito alegre, otimista, educado e muito prestativo, nunca vi, nem ouvi falar que alguém da família ou fora dela, tivesse qualquer crítica ou desavença com ele. No geral era muito querido e admirado. Depois que ele se foi, eu ouvi de vários tios, seus cunhados, rasgados elogios ao meu pai, ele era e continua sendo muito amado por todos que o conheceram.

Está certo que às vezes me parecia um tanto rigoroso, quando ficava bravo com desperdícios, do tipo encontrar um cômodo com a luz acesa sem ninguém nele. Eita! Aí o bicho pegava, ficava muito bravo e soltava lá seus impropérios…rs.

Papai com o netinho André Hideki

Ninguém é perfeito, ele teve seus problemas, momentos de depressão e situações negativas que descreverei num livro que um dia publicarei, por ora só falo do que ele representou em seu todo: Um exemplo de homem íntegro, sincero, verdadeiro, amigo, romântico, alegre e que adorava ouvir e contar piadas.

Eu me lembro quando íamos sair de casa para ir passear no Jardim Zoológico de São Paulo que ele recomendava para todos verificarem se estavam levando seus documentos. Na entrada do Zoológico ele repetia com insistência:  “Todos estão com seus documentos?”  E aí caia na gargalhada: “Se entrar sem documento, pode ser que não vão deixar você sair!” – Hahaha, uma piadinha que repito até hoje se vou ao Zoo com alguém!

Outra coisa que me fazia rir é o que ele recomendava antes de sairmos para uma visita, passeio, ou viagem:  “Já foram ao banheiro? Não saiam sem ir ao banheiro.” E emendava: “Meu sargento no Tiro de Guerra sempre dizia que tínhamos que sair para a missão “cagado e mijado”…” – Caramba! Aquilo parecia para mim muito engraçado!

O oitavo filho da italiana Rafaela Langhana, de Nápolis e do italiano José Porto da Calabria, não teve um pai para se espelhar como eu tive. Meu avô morreu quando meu pai era bebê, assim não sei como ele se tornou tão educado. Nunca perguntei isso a ele e só posso pensar que foi a educação que vovó lhe deu, provavelmente com a ajuda dos irmãos mais velhos, tios e tias, dos quais só conheci Tia Tereza Sanches e Tia Andina (Valentina) Zuanon.

Há uma passagem no livro “Menino Pobre” de Altino Bondezan, falando de acontecimentos na região de São Simão, perto de Ribeirão Preto (SP) que diz: “Comadre Rafaela, com sua penca de filhos, tomou o noturno para Presidente Prudente, emigrava de novo!”

Em São José dos Campos, escritório do Dr. Altino Bondesan, Autor de “Menino Pobre”, papai e o neto Ricardo Takeo

Toda vez que eu pegava este livro e lia esta passagem me dava um nó na garganta e meus olhos se enchiam de lágrimas, ao imaginar a situação da minha avó, repentinamente viúva, com oito filhos, o menor ainda de colo (meu pai), tomando a decisão de embarcar à noite num trem para uma cidade distante numa região que provavelmente não conhecia. Era a busca por uma vida melhor, na região da Sorocabana, onde fica a cidade prudentina, havia emprego e dava dinheiro nas colheitas de algodão e de café.

Bem, aquele bebê órfão, se tornou meu pai, avô de meus filhos, alguns que ele não chegou a conhecer. Na adolescência se tornou barbeiro, profissão que amava e até o fim da vida, ainda carregava sua maleta com a máquina, tesoura e acessórios para cortar ou dar uma aparada no cabelo, bigode, barba….dos sobrinhos e cunhados que visitava.

Depois de um acidente de automóvel que lhe obrigou a usar uma placa de platinum numa perna, não pode mais continuar atuando na barbearia, porque não era recomendável ficar em pé o dia todo. Mas logo se mostrou um excelente gerente financeiro de uma filial da capital de São Paulo, da Brasifrio, indústria de balcões frigoríficos com matriz em Londrina PR.

Papai cortando o cabelo do neto Ricardo Takeo, a profissão que nunca largou.

Depois que saiu da Brasifrio, acabou gerenciando as compras e várias operações da Bonecos da Vovó, empresa que criei para a minha mãe, que, muito criativa, fabricava bonecos que vendíamos em pequenas lojas e bazares do bairros de São Paulo e ABCD. Enfim, meu pai não sabia ficar parado, não se acomodava.

Se por um lado não teve formação escolar além do Primário, por outro lado era um homem muito culto, porque lia os principais jornais do país:  O Estado, Folha de São Paulo, Jornal do Brasil e a Gazeta Esportiva, todos de assinatura do Salão Preferido, barbearia que era sócio ali na Rua Florêncio de Abreu, 36 – 1º Sub-solo, bem ao lado do Mosteiro de São Bento. Lá ele lia também as revistas Manchete e O Cruzeiro. Além destas publicações que recebia na barbearia, ele sempre tinha no bolso paletó, ou uma revista Seleções Reader’s Digest, ou um romance ou livro de poesias.

Mamãe, Dona Célia, eu com meus filhos André Hideki (no colo) e Ricardo Takeo, com meu pai, sempre orgulhoso da família que tinha.

Por incrível que possa parecer, quando eu cursava na Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, muita coisa ele me ensinava. E ficou muito orgulhoso quando soube que o filho do seu cliente, o banqueiro Vidigal (Banco Mercantil) foi meu funcionário quando trabalhei no Grupo Engesa, fato que soubemos por acaso quando vimos a Lucinha (Sra. Lúcia Vidigal) num programa da TV Cultura e ele comentou que a conhecia, e eu disse: é mãe do meu funcionário!

Do meu pai eu ouvia expressões que não eram comum na boca de outras pessoas  do nosso círculo de relacionamento, como por exemplo, ao pedir um favor, ou uma informação ele começava a frase com algumas dessas expressões:  “Por obséquio”;  “Por fineza”; “Por gentileza”; “O senhor poderia por favor”, etc…

Muitas vezes eu o vejo em mim, no que digo, no que faço, assim como já me observei no jeitão de meus filhos e esta é uma das formas como nos eternizamos no universo e não só com a presença de nossa alma na roda da vida, reencarnando, ou aguardando a volta de Cristo.

Hereditariedade de Eugênio José Porto: seu filho Edison (Autor), seus netos André Hideki, Ricardo Takeo, Lia Tie e Lorenzo Eugênio e, sua bisneta Vitória Alice, em Jundiaí SP,
07-julho-2019

É… meu querido pai, de certo forma eu me lembro do Senhor todos os dias, eu lhe sou grato pela vida que me deu e por tudo que me ensinou. Ainda me lembro com carinho, quando eu fingia que já estava dormindo, só pra sentir seu beijo de boa noite, ajeitando as cobertas sobre mim. Também tenho saudades de sentir o seu coração no ronronar do seu peito quando nas viagens de ônibus adormecia no seu colo. São tantas lembranças boas. A maneira como segurava meu queixo para pentear meus cabelos….e por aí vai.

Sinceramente, espero que meus filhos possam se orgulhar e se lembrar de mim com o mesmo amor que me lembro do meu amado papai, o querido Tio Zé, dos meus primos.

Depois que publiquei este texto pela primeira vez, a querida Luiza Fumiko Ishii, viúva de meu primo Albino, fez comentários no meu Facebook que achei interessante acrescentar nesta descrição do meu pai, assim ela disse:

“Tudo isso é uma verdade que eu Também tive a alegria de presenciar …. Tio Zé Porto….. Um homem que realmente serve de exemplo pra ser homenageado neste dia muito especial… Tio Zé era sério, muito correto com tudo que fazia, era realmente um homem muito, mas muito culto, e muitas vezes muito engraçado 😂…..
Vc lembra as coisas que ele “aprontava”, por exemplo, ele não gostava de ver ninguém acordando tarde, até em pleno domingo, se aproximava bem debaixo da janela do quarto da Celinha (filha casada) e ficava chamando bem alto o cachorro (que na verdade estava quase no colo dele) e ele mesmo falava “ainda tenho que ficar chamando o cachorro sem precisão”…. lembra Edison?… Não podia ver o ponto de ônibus cheio de bituca de cigarros, ver uma pessoa com a gravata torta…. Enfim, Ah quanta saudades tio Zé!!!!” 😍

Foto de Capa: Papai ao fundo, observa à sua direita, o filho Eduardo (in memoriam) com o neto Júlio Rocha, e à sua esquerda o filho Edison (Autor), com o neto Ricardo Takeo.

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Sobre o autor: Edison Porto, administrador pela Eaesp/FGV; MBA em Finanças pelo IBMEC-SP, bacharelando em Direito e Jornalismo; Técnico em Agronegócio – SENAR SC; Membro da Associação dos Amigos do Museu do Contestado de Caçador, da Associação Cultural Coração do Contestado de Lebon Régis, da ACIJO  Associação Caçadorense de Imprensa e do Núcleo de Comunicações da ACIC Associação Empresarial de Caçador. Conselheiro Municipal de Turismo e de Cultura. Ocupa a cadeira nº10 da Academia Caçadorense de Música. Editor do Jornal Caboclo.

P.S.: Os conceitos emitidos por artigos ou por textos assinados e publicados neste jornal são de inteira responsabilidade de seus respectivos autores.

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