Jornal Caboclo

da região do Contestado, SC

Colunas e Opinião

Marcas do Coronavírus 2019, escreve Patrick Eduardo Boff

Dois relatos das consequências devastadoras causadas pela doença Covid-19

Por Patrick Eduardo Boff

Em 2.021 anos do calendário gregoriano, o mundo já vivenciou diversas pandemias globais que mataram milhões de pessoas em diferentes séculos. Em meados do século XIV, estima-se que a Peste Negra vitimou entre 75 a 200 milhões de pessoas no mundo, sendo que este período ficou conhecido na Europa como a idade das trevas. Já no início do século passado, entre os anos de 1918 a 1920, a gripe espanhola matou entre 17 a 100 milhões de pessoas, vitimando mais do que a 1º Guerra Mundial, que no período de 4 anos, estima-se que nela morreram de 13 a 20 milhões de pessoas.

Em quase dois anos de pandemia do Covid-19, já foram registradas quase 3,7 milhões de pessoas mortas no mundo. No Brasil, o número de óbitos chegou a 486 mil. Já em Chapecó, no Oeste de Santa Catarina, cidade de aproximadamente 224 mil moradores, segundo o censo de 2020; até hoje (13/junho/2021) já foram registradas 633 mortes, sendo que 0,4% da população chapecoense morreu em decorrência da doença.

Em algumas culturas ocidentais, a cerimônia de despedida é algo muito marcante e sentimental para que os familiares  relembrem todos os momentos bons e como era a pessoa em vida. Mas nesta situação pandêmica, 633 famílias não puderam se despedir e nem ver o seu familiar, um sentimento triste, isso porque, segundo os infectologistas, as vítimas do novo coronavírus podem abrigar o vírus dentro do seu organismo, mesmo após a morte, desta forma, os caixões são velados fechados, principalmente para oferecer segurança aos funcionários e familiares, evitando e minimizando os riscos à saúde.

Uma dessas 633 famílias foi a do funcionário público municipal Claudistoni Ramão Pinheiro, que perdeu pai e mãe no intervalo de uma semana. Claudistoni relatou que seu pai já havia se infectado 4 meses antes, mas os sintomas foram leves, e se recuperou com pequenas sequelas estomacais e pulmonares e estava em tratamento pós-covid. No início de fevereiro, o filho mais novo, que morava com o casal, foi diagnosticado com Covid. Uma semana depois sua mãe foi infectada e estava fazendo o tratamento em sua casa. Os sintomas foram se agravando e ela foi encaminhada novamente a UPA, e o sistema de saúde recomendou que dona Melania voltasse para sua casa com todos os  medicamentos. Passou-se mais alguns dias, dona Melania teve seus sintomas agravados com falta de ar e dores no corpo, pois ela era do grupo de risco (Diabética e com problemas cardíacos), sendo levada às pressas a UPA e transferida para UTI do Hospital Regional.

No dia 23 de fevereiro, Dona Melania acabou falecendo vítima do Covid-19, com quatro dias de internação. Neste mesmo dia, João, seu esposo e pai do Claudistoni, teve uma recaída drástica e foi internado com sintomas de reinfecção da doença, sendo levado às pressas ao Hospital e entubado na UTI. Seu João apresentou melhora no 4º dia de internação, mas no 5º dia acabou piorando, falecendo no dia 28 de fevereiro, ou seja, em apenas cinco dias de internação.

Durante o período em que seus pais estavam internados no hospital, Claudistoni relembrou e nos relatou como foram aquelas semanas: “esses dias foram muito agonizantes, entristecedor e com muita esperança que eles melhorassem”.

Mas, infelizmente as notícias diárias que eram repassadas aos familiares não eram boas, e quando Claudistoni soube do falecimento de seus pais, ele contou que os primeiros dias foram muito difíceis, pois lhe vinham muitas lembranças de seus pais através de objetos que o recordavam deles: “Nas primeiras semanas  vinham muitas lembranças e sentimentos indescritíveis, sentia muita saudade e vontade de chorar a todo o tempo. Acordava de madrugada e saia para caminhar na rua não acreditando na notícia da morte de meus pais. Eu cultivo uma horta em meu trabalho e isso me lembra muito o meu pai, pois foi ele quem me ensinou. Quando vou lavar minha roupa eu sempre lembro da minha mãe, pois era ela quem sempre lavava a minha roupa, então quando me lembro  sempre me dá aquela agonia.”

Com um sentimento meio de culpa, Claudistoni disse que faria tudo diferente se tivesse a oportunidade de voltar para aqueles dias quando viu sua mãe e seu irmão com os primeiros sintomas. Achando que sua mãe ia melhorar como seu pai quatro meses atrás quando pegou a doença e se recuperou, eles optaram em esperar achando que dona Melania iria melhorar demorando os quatro dias para procurar atendimento. Em relação a demora na procura de atendimento, Claudistoni deixa um recado e reforça: “Se você tem  algum sintoma, ou algum familiar que apresente sintomas, ou se você positivou Covid-19, não espere e procure imediatamente atendimento”.

Já dos 32.402 chapecoenses recuperados, quatro estão na família Boff, da qual o empresário Antônio Boff ficou 19 dias internado na UTI do hospital regional,saindo no dia 18 de fevereiro quando completou seus 62 anos de idade. Marco Antonio Boff, filho de Toni Boff, como é conhecido Antônio, falou do drama de ter seu pai na UTI e sua mãe Neusa hospitalizada na UPA.

No início a família não procurou atendimento imediato achando que as dores que Toni estava sentindo eram relacionadas ao problema de reumatismo. Marco relatou sobre a situação de seu pai durante esses dias: “As dores foram se intensificando, e com isso o pai começou a ter febre. Desconfiei que o pai estava com a doença, e o levei a UPA, onde os médicos fizeram todos os procedimentos e pediram que o pai fizesse o teste de Covid, que demorava cinco dias para sair o resultado, dando todos os medicamentos para ele”.

Marco achou melhor não esperar o resultado e resolveu levar seu pai para fazer um teste de farmácia. Resultando positivo, Marco levou seu pai ao Hospital da Unimed, onde foi medicado novamente e encaminhado para sua casa. Marco contou que seu pai ficou em isolamento por duas semanas não demonstrando nenhuma melhora: “Meu pai sentiu muita falta de ar, eu e a mãe resolvemos levar ele de novo a UPA, onde o pai ficou no Oxigênio sendo encaminhado com urgência ao Hospital Regional”.

Toni disse que chegou ao hospital e foi encaminhado a um quarto onde ficou em observação recebendo oxigênio e medicamentos, não tendo nenhuma melhora. “No terceiro dia de hospital e meu quadro clínico estava cada vez pior, a equipe médica resolveu me internar na UTI onde fiquei em coma por 16 dias. Não me lembro de nada do que aconteceu durante todos esses dias”.

Marco era quem recebia as informações através dos telefonemas dos médicos e enfermeiras do hospital repassando todo o quadro clínico de seu pai aos seus familiares. Os médicos, segundo ele, só deram 5% de chances de sobrevivência e sempre foram bem sinceros sobre a situação que seu pai estava. Ele contou que esses 16 dias foram muito difíceis para ele e toda sua família, Marco não conseguia dormir, preocupado e com medo de perder seu pai e acrescentou: “No meu trabalho na empresa do pai, eu não conseguia desenvolver minhas tarefas e funções por conta da preocupação e lembranças  que vinham do pai”.sa

Antonio Boff saindo do Hospital

Mas quando seu pai acordou do coma, Marco não acreditou na notícia e começou a chorar continuamente de felicidade, não conseguindo mais falar com a enfermeira que estava do outro lado da linha. Toni recebeu alta do hospital  e voltou para sua casa, sendo que nos primeiros dias, segundo seus familiares, teve muitas dificuldades pois não caminhava direito, não conseguia se comunicar e precisou usar fraldas durante 3 dias. Mesmo depois de quase dois meses de internação, Toni ainda está em tratamento pós-covid e ainda tem algumas sequelas da doença preocupando sua família por conta disto.

Por isso, o recado que Marco e dona Neusa deixam para as pessoas, e que reforçamos: “se cuidem, usem máscara, álcool em gel e todos tomem todas as medidas de prevenção  e segurança, para que você não passe por essas situações de sofrimento, não podendo nem ver e  se despedir do familiar  quando se torna mais uma vítima  da Covid-19”.

Nota do Editor: Foto de capa do Jornal do Comércio

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Sobre o Autor: Patrick Eduardo Boff, estudante de Jornalismo da Unochapecó – Universidade Comunitária da Região de Chapecó e de História na Universidade Federal da Fronteira Sul.

P.S.: Os conceitos emitidos por artigos ou por textos assinados e publicados neste jornal são de inteira responsabilidade de seus respectivos autores.

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