Jornal Caboclo

da região do Contestado, SC

Colunas e Opinião

Discuti com Deus e o Maestro me apresentou ao Coral, escreve Edison Porto

Todos nós temos dons inatos, mas podemos aprender também

Por Edison Porto

Desde pequeno convivi com a música, meu irmão mais velho (Eugênio) tinha aulas de acordeom, que eu chamava de sanfona e no sul onde vivo agora, chamam de gaita (o que soava bem estranho para mim, mas já me acostumei).  Até hoje, tenho na mente os acordes de “Saudades de Matão” que ele repetia muito, não sei se porque gostava, ou se era obrigação de estudos.

Orquestra e Coral Amimu

Aí, da pré-adolescência para adolescência, o segundo irmão mais velho (Eduardo), formou uma banda daquelas típicas da Jovem Guarda. Ele e seus amigos ensaiavam numa edícula nos fundos de nossa casa, todo santo fim de semana!  Várias músicas ainda estão na minha memória. A Banda teve pelo menos dois nomes:  Bossa Jazz IV e Conjunto Safari. Chegaram a se apresentar num programa da antiga TV Bandeirantes e era muito bom levar minha namorada aos bailes onde tocavam. Claro, eu tinha passe livre!

Lá pelos meus cinco anos, pedi ao Papai Noel uma gaita de boca, e ele trouxe, mas nunca consegui tirar algum som razoável nela. Sempre achei bonito o som dos instrumentos de sopro, e morria de inveja de um primo da minha idade que fazia sucesso com as meninas tocando violão. Por causa disso fui ter aulas de violão com o guitarrista Moacir, da Banda do mano. Ele tinha um método bem racional e eu já arriscava uma música do Roberto Carlos, dedilhando lentamente o: “Eu daria a minha vida……”  –  mas, não deu certo, parei.

Maestro Patrick Cavalheiro regendo Orquestra e Coral Amimu

Gostava de ver o mano Eduardo desenhando de forma estranha, canhoto, mas desenhava bem. Fazia letras góticas lindas. Admirava livros de pinturas japonesas, ficava encantado quando via esculturas mostrando pessoas com perfeição. Enfim, sempre admirei as artes.

Até que um dia me vi discutindo com Ele, o Senhor. Nada mais nada menos que Deus, com todo respeito é claro!  Eu reclamava:  Senhor, eu queria cantar e não sei, queria tocar um instrumento e não sei. Queria desenhar e não sei. Queria pintar e não sei. Queria dançar e não sei. Queria esculpir e não sei. Queria……. Aí ele me interrompeu com uma voz firme, mas aquela de pai amoroso que não está bravo, mas que a gente respeita e disse: “Edison, você quer, por favor, ficar quieto?”  – Um jeito bem gentil de mandar um falastrão resmungão calar a boca!

Lógico! Emudeci de imediato, eu não sei bem como tudo aconteceu, porque lembro bem da conversa, mas não lembro como Ele é, só sei que era o Criador de Tudo. Até hoje, me pergunto se sonhei, se foi uma viagem astral ou simples fruto da minha sempre fértil imaginação.

O que sei é que naquele momento de silêncio, próprio das meditações transcendentais, naquela busca de não pensar em nada esperando um “insight”… Bah! Caiu a ficha!  Tá certo Senhor já entendi!!!!!!

Coral Jovem da Amimu

Eu reclamava com Deus que ele não tinha me dado nenhum “Dom”, nenhum “Gift” como dizem os gringos. E de repente, Ele me fez ver que me deu o dom da fala, da comunicação, da expressão oral e escrita, uma característica que parece comum aos geminianos. Quem me conhece sabe que sou bem loquaz e, embora eu tente me conter, se deixarem, eu perco as estribeiras e falo sem parar. Aliás, as minhas paqueras sempre descobriram que minha falação era uma forma de mascarar minha timidez!  (Pode acreditar!)

Pois é, sou grato a Deus por ter um português razoável, saber me comunicar razoavelmente bem em inglês, nos dois casos, tanto na forma escrita, como oral. E, na forma oral eu me viro também em italiano; francês, espanhol e até em japonês (línguas que de fato estudei).

Vivendo no agito da segunda maior capital das Américas, era impossível, em São Paulo, tentar desenvolver qualquer outra aptidão. Perdendo muito tempo no trânsito, estresse para ir para qualquer lugar, sempre fazendo um curso ou outro (como Astronomia; Astrofísica; História das Religiões; Reki; Ireca; Direito; Soroban; etc) além das artes marciais (Judo; Taekwondo; Kendo; Kenjutsu; Iaijutsu; Jojutsu), só tinha contato real com o prazer de cantar quando ligava o “vídeokê” em casa, ou ia com amigos a algum “karokê” (e aí só cantava, e mal, canções italianas e japonesas das décadas de 60 e 70).

Ah…mas aí abandonei o burburinho da cidade grande. Vim morar no Contestado, onde as araucárias, curucacas e capivaras me encantam.  Fiz um curso de dança, mas como não tinha prenda fixa e foram sete delas me aturando, repeti o curso com a querida Lara Inoue, a japinha também paulistana que me deu a chance de aprender um pouco do bugio, da vanera, do xote….

Opa, comecei a achar que seria possível um dia dançar um tango de Gardel com uma rosa na boca!  Mas cantar, continuava sendo só em japonês e em casa, de preferência com uma garrafa de sakê…rs.

Porem, nos últimos anos na capital paulistana, eu acompanhava o Coral Compasso 22 do Colégio Santa Maria onde nossos filhos estudavam e a companheira Mônica Haymussi cantava. Era muito bonito, um coral diferente, cheio de performances com danças e bate palmas, pés….enfim muito legal e, através do grupo descobri os maravilhosos encontros de corais.

Ópera O Barbeiro de Sevilha

Sempre que pude curti bons shows de música.  A vida sempre me trouxe pessoas que me ensinaram coisas boas, como a amiga Jacquelina Dankfort que me levou aos belíssimos Concertos na Sala São Paulo (magnífica!) e aos shows de rock no Parque do Ibirapuera. A partir de 2001, visitando a cidade de Caçador (SC), não perdia uma apresentação musical da Associação dos Amigos da Música – Amimu, fosse Coral ou Orquestra se apresentando.

Até que um dia, após uma Audição Didática da Amimu, na Câmara Municipal de Caçador, numa conversa com o Maestro Patrick, comentei do meu encantamento com a Música. Muito esperto ele logo me convidou para participar do Coral da Amimu. Olhei bem sério pro  Maestro e disse: “sabe Patrick, outro dia eu discuti com Deus!”

Então lhe contei toda a história que narrei antes, para mostrar a ele que eu não tinha o dom da música, eu não tinha o dom para tocar algum instrumento ou para cantar. Ao que ele com seu jeito seguro e gentil disse:  “Edison, qualquer pessoa pode cantar!”

O Chefe de Polícia dá voz de prisão ao Conde em O BARBEIRO DE SEVILHA

Dei risada duvidando, eu jamais cantaria como aquele pessoal que tinha acabado de se apresentar. O Maestro insistiu:  “Eu desafio você a entrar pro coral e ver que você pode cantar!” – Marrudinho como eu era quando jovem, retruquei:  “Pois bem, então eu desafio você conseguir fazer com que eu cante!”

 

E foi assim que eu entrei para o Coral da Amimu. É claro que não virei cantor de uma ora para outra. Mas já tive o prazer de participar de várias apresentações com o Coral e posso dizer que sou, talvez, o único vivente residente em Caçador que já cantou uma ária numa ópera. Foi no dia 22 de setembro de 2017, data histórica em que cantei algumas frases, como chefe de polícia dando voz de prisão ao Conde em O BARBEIRO DE SEVILHA!

Coral da Amimu

Cantar é muito bom, cantar num Coral é maravilhoso. A amizade entre os coralistas, a ajuda que se recebe, a camaradagem, as gozações, tudo é muito agradável. Até mesmo quando o Maestro fica bravo eu gosto, porque ele tem um jeito todo especial de ensinar e quando fica bravo, seus ensinamentos me soam mais claros ainda.

Mas uma coisa eu não contei ainda, e não sei quantas pessoas notaram. Foi o meu primeiro dia no Coral. A sensação era como se o Maestro Patrick estivesse rasgando um véu para eu enxergar um outro mundo. Eu fiquei tão agradecido de estar ali com o coral, que ao final fui tentar dizer a ele desta minha felicidade e lhe agradecer, mas me veio um choro inexplicável, uma emoção forte que eu não consegui conter, não me lembro o que balbuciei. Eu estava num tipo “estado de graça”, algo que nunca saberei explicar. O Maestro Patrick com sua alta sensibilidade para a música, deve ter percebido que minha alma vibrava num outro tipo de compasso, uma oitava astral…sei lá. E quem notou aquela cena, não fez qualquer menção, respeitou o meu momento, algo divino e espiritual.

No dia 19/out, o Maestro Patrick hoje publicou nas redes sociais: “Hoje é comemorado o dia do coralista no estado de Santa Catarina (Lei n.º 6675 de 31/10/1985, consolidada na Lei n.º 16.719 de 2015). O maestro José Acácio Santana foi um dos propositores desta data especial, que foi apresentada pelo deputado Vasco Furlan e aprovada pelo governador Esperidião Amin Helou Filho.”  (Já cantamos músicas/arranjos do Maestro Acácio!)

Assim, eu encerro este texto que é um dos capítulos do Livro “Eu Vivi!” que um dia será editado. Mas encerro com meu profundo agradecimento ao Maestro Patrick, seus pais e a toda equipe de músicos, professores, componentes da Orquestra e do Coral. Obrigado amigos queridos.

Parabéns Coralistas de todo o mundo pelo seu dia aqui no lindo Estado de Santa Catarina.

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Sobre o autor:

Edison Porto, administrador pela Eaesp/FGV, MBA em Finanças pelo IBMEC-SP, bacharelando em Direito e Jornalismo. Membro da Associação dos Amigos do Museu do Contestado de Caçador, da Associação Cultural Coração do Contestado de Lebon Régis, da ACIJO  Associação Caçadorense de Imprensa, do Núcleo de Comunicações da ACIC Caçador. Ocupa a cadeira nº10 da Academia Caçadorense de Música. Editor do Jornal Caboclo.

P.S.: Os conceitos emitidos por artigos ou por textos assinados e publicados neste jornal são de inteira responsabilidade de seus respectivos autores.

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